A tramitação do Projeto de Lei do Senado 336/2018 reabre o debate sobre a utilização de fundos de investimento em participações (FIPs) em operações de M&A. Inspirada na Medida Provisória 806/2017, o texto retoma a proposta de elevar a tributação de FIPs constituídos como condomínios fechados. O PLS é de autoria do senador José Serra (PSBD-SP) e aguarda emendas na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado. Da forma como foi apresentado à Casa, o texto elimina benefícios fiscais para um instrumento do mercado de M&A que vinha crescendo.
Embora a mudança na tributação de FIPs tenha sido debatida no âmbito da MP 806/2017, a norma não foi convertida em lei pelo Congresso Nacional e perdeu vigência em abril. A questão foi retomada por Serra na forma de projeto de lei, cuja tramitação é vista por ele como mais adequada para o caso, porque, para o senador, pode contribuir com o ajuste fiscal do governo federal.
Leonardo Ribeiro, assessor parlamentar do tucano, espera que a proposta seja aprovada e sancionada até o fim de 2018 para que possa vigorar já em 2019. O texto prevê a elevação da alíquota de imposto de renda sobre ganho de capital aplicada sobre as transações dos fundos da faixa de 15% à 22% para 34%. Na época em que a MP 806/2017 foi emitida, a União calculava que a mudança resultasse em uma arrecadação extra de R$ 10 bilhões. A expectativa é de que o valor seja considerado pelo Executivo como receita condicionada para o orçamento do ano que vem.
Além de colaborar com o ajuste fiscal, Ribeiro pondera que o PLS promove uma uniformização no mercado de fundos, já que a tributação sobre FIPs abertos é de 34%. “Existem FIPs que atuam como uma holding e acreditamos que é possível seguir com o debate em um cenário em que discutimos mudanças na legislação tributária para tornar o sistema mais justo”, disse ao Lexis 360.
Estratégia fiscal
Os membros da CAE terão até o dia 2 de agosto para apresentar emendas ao texto apresentado por Serra. Se a elevação da alíquota for mantida durante a tramitação da proposta, a mudança na legislação terá impacto direto na fiscalização da Receita Federal. Embora a lei não retroaja, decisões como o recente entendimento do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) sobre a aquisição do Hospital São Luiz pela Rede D’Or, na segunda-feira (16), poderão não se repetir.
O negócio foi realizado em 2010, quando os antigos donos do São Luiz criaram um FIP para controlar o hospital antes da venda para a Rede D’Or. Se a transação tivesse sido realizada com a estrutura anterior, diretamente entre a companhia dona do São Luiz e a Rede D’Or, a tributação a ser recolhida era de 34% sobre o ganho de capital. Com o FIP, porém, a alíquota aplicada foi a mesma estabelecida para pessoas físicas, entre 15% e 22,5%, paga pelo cotista no momento do resgate dos rendimentos do fundo.
Ao avaliar o negócio, realizado em 2010, a 1ª Turma da 2ª Câmara da 1ª Seção do Carf considerou que a estrutura criada estava dentro da lei. Hermano Notaroberto Barbosa, sócio da área tributária do BMA Advogados, relata que existem muitos precedentes em que o fisco desconsiderou determinados atos societários para tributar o que seria a real operação. A avaliação das autoridades costuma ser feita caso a caso, alimentando o debate sobre os limites do planejamento de estruturas transacionais a fim de reduzir custos tributários. “O problema não está no uso do fundo e, sim, quando a operação tem características artificiais para tentar esconder uma operação que deveria ser tributada de outra maneira”, explica.
Vantagens em risco
A mudança legislativa prevista no PLS 336/2018 deve colocar fim a essa discussão. Na avaliação de Barbosa, a aprovação e sanção da proposta deve provocar mudanças significativas do planejamento do mercado de FIPs. José Maurício Abreu, sócio da área tributária do Miguel Neto Advogados, acredita que a elevação da tributação torna a utilização de FIPs fechados para operações de M&A desinteressante. “É mais um ponto negativo para o mercado de M&A. A gente tem uma economia que não está nas suas melhores condições e os FIPs costumam ser instrumentos para negócios com empresas deficitárias justamente pelo imposto diferido”, pondera Abreu. “Tirar um mecanismo de ajuda desse mercado é ruim.”
Bruno Guarnieri, sócio da área societária do Miguel Neto Advogados, observa que operações estruturadas por meio de FIPs são, majoritariamente, realizadas no mercado de médio porte (middle market) e que muitas empresas familiares têm buscado essa estrutura pensando em um futuro M&A, mesmo sem ter um comprador à vista. “A estrutura de FIP é utilizada para organizar os negócios da família e para ter uma vantagem fiscal em uma futura venda”, diz.