O Ministério da Infraestrutura foi avisado pela B3, a Bolsa de São Paulo, que haverá propostas para todos os 28 empreendimentos a serem concedidos na Infra Week, evento de três dias de leilões de 22 aeroportos, cinco terminais portuários e um trecho da Fiol (Ferrovia de Integração Oeste-Leste) que começa nesta quarta-feira (7).
Na avaliação do mercado, porém, a maior percepção de risco em relação à economia do país no pior momento da pandemia pode prejudicar a concorrência e ter efeitos negativos nos ágios do leilão, que vem sendo divulgado pelo governo como parte do “maior programa de concessões em infraestrutura do mundo”.
A expectativa é que só haja competição pelos aeroportos, especialmente os do Bloco Sul, que tem como atrativos Curitiba e Foz do Iguaçu (PR) e aeroportos regionais de intenso tráfego em Londrina (PR) e Navegantes (SC).
Também existe a expectativa de que um novo entrante estrangeiro arremate o Bloco Norte, cujo carro-chefe é o aeroporto de Manaus (AM), por onde escoa boa parte das exportações da Zona Franca. O nome não foi revelado.
Nesta quarta-feira, primeiro dia da Infra Week, serão leiloados 22 aeroportos agrupados em três blocos. O vencedor levará o bloco, que conta com alguns aeroportos rentáveis e outros que precisam de investimentos e, sozinhos, não despertariam interesse.
O governo espera garantir R$ 6 bilhões em investimentos com essa rodada de leilão de aeroportos, a maior parcela (R$ 2,8 bilhões) decorrente da concessão do bloco Sul.
No dia seguinte será a vez da Fiol (Ferrovia de Integração Leste-Oeste), projeto fundamental para o escoamento do minério de ferro produzido na região de Caetité (BA) e a produção de grãos do oeste da Bahia pelo Porto Sul, complexo portuário a ser construído nas imediações da cidade de Ilhéus (BA).
O governo aposta que o grupo brasileiro Bamin, de mineração, faça uma oferta, mas ainda a possibilidade de que chineses possam fazer uma proposta pelo trecho de 537 quilômetros desse empreendimento, restrito à região entre Ilhéus e Caetité.
Futuramente, a obra completa permitirá uma conexão da Fiol com a Ferrovia Norte-Sul, espinha dorsal ferroviária que cruza o país de norte a sul. O trecho a ser concedido garantirá R$ 3,3 bilhões em investimentos, contabilizando a construção da via que consumirá R$ 1,6 bilhão. O contrato será de 35 anos.
Na sexta-feira (9), serão concedidos cinco terminais portuários —quatro no porto de Itaqui (MA) e um no Porto de Pelotas (RS). Estão previstos mais de R$ 600 milhões em melhorias nesses terminais.
Pelos cálculos do Ministério da Infraestrutura, os empreendimentos devem atrair somente R$ 642 milhões em outorgas. Em troca, garantirão R$ 10 bilhões em investimentos ao longo da concessão e a geração de 208 mil postos diretos e indiretos de trabalho.
“Não é nosso objetivo [outorgas]. Só estamos usando investimento cruzado em ferrovias [em que as outorgas elevadas ajudam na construção de outros projetos que serão posteriormente concedidos]”, afirmou Tarcísio durante uma videoconferência realizada pela B3. “Nosso objetivo, primeiro, é a geração de investimentos porque, com eles, virão os empregos.”
Segundo o ministro, sob sua gestão foram concedidos 41 empreendimentos, atraindo R$ 44 bilhões em investimentos com a geração de 659 mil postos diretos e indiretos de trabalho atrelados às concessões. Os cofres da União receberam R$ 13 bilhões em outorgas no período.
Advogados e executivos às voltas com a preparação para as ofertas veem um aumento da percepção de riscos por parte do investidor, motivadas pela elevação do risco fiscal, pelo descontrole da pandemia e pela possibilidade de mudanças no comando do programa de privatizações.
Para Bruno Pereira, sócio da Radar PPP, o governo “vem sendo pródigo” em dar insumos para aumento na percepção de risco. “Não apenas diante da crise sanitária e fiscal, mas também em função de nossa crise política, institucional e também, talvez a mais preocupante, em função de nossa crise sobre a visão prospectiva que não se tem sobre o país”.
O cenário de falta de controle da pandemia tem impactos diretos nas perspectivas de retorno das concessões, principalmente no caso dos aeroportos. “A gente não tem um plano claro para a pandemia, estamos muito desgovernados”, resume a advogada Patrícia Agra, do escritório LO Baptista.
Caio Cascione, do Cascione Advogados, diz que, na disputa por contratos de longo prazo, o investidor costuma não demonstrar tanta preocupação com a conjuntura, mas admite ter percebido maior sentimento de risco entre os investidores, principalmente após notícias de que o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello assumiria o PPI.
“Mas como notícia veio muito em cima, empresas que já tomaram decisões não devem voltar atrás. No máximo, o que pode haver aí é um apetite menor em desconto ou no valor da outorga”, comenta.
Fábio Luiz Izidoro, do Miguel Neto Advogados, também vê possíveis impactos na disposição para colocar lances mais altos em meio à pandemia. “O sentimento é positivo, mas é obvio que está todo mundo com receio da situação da pandemia. Então, talvez a gente não tenha os melhores lances.”
“O cenário da pandemia não pode ser desprezado, efetivamente acabou trazendo um recuo em termos de perspectiva de investimento”, concorda Pedro Henrique Poli Figueiredo, ex-conselheiro do TCE/RS e consultor de Souto Correa Advogados.
Ele aponta, porém, que o esforço para repactuar contratos de concessão já estabelecidos é um sinal positivo para investidores que decidirem apostar nos novos leilões. E avalia que, em um cenário com menor oferta de novos projetos, os leilões desta semana abrem importante janela de oportunidades.
“É uma sinalização muito positiva para o mercado. E ao pegar três áreas muito importantes –portos, aeroportos e rodovias–, tira o foco das rodovias e demonstra uma intenção também de crescimento em termos do uso de outros modais.”
O ministro Tarcísio quer aproveitar os leilões da Infra Week como teste com os investidores para as próximas rodadas deste ano, que contarão com até 50 projetos. Dentre eles estão as BRs 153 e 163, a Novadutra, os portos do Espírito Santo e de Santos e outros 16 aeroportos, incluindo Congonhas (SP) e Santos Dumont (RJ).
Juntos, esses empreendimentos devem atrair mais R$ 84 bilhões e gerar 2,9 milhões de empregos diretos e indiretos. Deste total, o setor ferroviário deve concentrar R$ 41,6 bilhões em investimentos, seguido pelos terminais portuários (R$ 32 bilhões).
Por isso, já marcou reuniões com 12 grupos de investidores, a maioria estrangeira, que ocorrerão na tarde desta quarta na Bolsa.
A ideia, segundo assessores do ministro, é apresentar os próximos empreendimentos e ouvir os interessados para “calibrá-los”. O ministério pretende, assim, ajustar a modelagem de cada projeto para garantir o apetite dos investidores.