O que os investidores atentos de Distressed M&A já entenderam

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Nos bastidores do mercado de fusões e aquisições (M&A), há um segmento que costuma provocar calafrios — e despertar o faro apurado de quem sabe identificar valor onde poucos enxergam oportunidade.

Trata-se das chamadas operações de Distressed M&A, expressão que, traduzida literalmente, refere-se à compra de empresas em dificuldades. A tradução, porém, empobrece o conceito e contribui para a percepção equivocada de que se trata apenas de adquirir negócios à beira da falência.

A realidade é mais rica e, para os investidores certos, mais promissora. Embora o termo distressed remeta ao clássico cenário de insolvência — empresas descapitalizadas, com dívidas impagáveis e operações desestruturadas — ele cobre, na prática, um espectro mais amplo de situações. É nesse território cinzento, onde os desafios são múltiplos e as soluções pouco óbvias, que surgem as oportunidades mais interessantes.

O primeiro e mais visível tipo de operação envolve a crise financeira direta. Companhias que perderam a capacidade de honrar compromissos estão em recuperação judicial ou prestes a solicitar uma, e precisam vender ativos para sobreviver ou saldar parte de suas obrigações. É o caso, por exemplo, do cenário vivido pela Avianca Brasil.

Mesmo com suas operações aéreas praticamente paralisadas, a empresa ainda detinha slots nos aeroportos mais disputados do país, como Congonhas e Santos Dumont. O ativo não era a operação aérea — que estava em colapso —, mas sim o direito de operar nos horários nobres desses aeroportos, o que motivou uma intensa disputa entre concorrentes estratégicos. O investidor que atua nesse perfil não compra o “negócio quebrado”, mas a parcela que ainda tem valor, mesmo em meio ao caos.

O atrativo principal costuma ser o preço, pois os ativos são vendidos com grandes descontos, muitas vezes no âmbito da recuperação judicial. Nesse cenário, ganha destaque a figura da Unidade Produtiva Isolada (UPI), prevista na Lei de Recuperação e Falência, que permite a alienação de ativos sem a sucessão de passivos da empresa devedora. Isso oferece segurança jurídica e atratividade ao comprador. Mas o caminho exige familiaridade com passivos ocultos, ambiente litigioso e engenharia jurídica sofisticada. Poucos têm apetite — e é aí que mora a vantagem competitiva.

Mas há empresas em que o problema não está no caixa, e sim no topo. Um perfil cada vez mais recorrente envolve companhias financeiramente saudáveis, com boa geração de caixa, ativos robustos e presença consolidada, mas que estão paralisadas por conflitos societários — em especial, disputas familiares. Um exemplo emblemático desse tipo de crise foi a longa e pública disputa entre os herdeiros da Casas Pernambucanas.

Após a morte da matriarca Helena Lundgren, conflitos sobre a sucessão e o controle acionário travaram a gestão da empresa por anos, resultando em bloqueios de dividendos, paralisação de decisões estratégicas e esvaziamento da operação em várias regiões do país. Durante décadas, a empresa viu seu faturamento encolher e suas lojas desaparecerem do mapa, não por falta de mercado ou produto, mas por entraves internos.

Esse tipo de operação não demanda apenas capital, mas sobretudo habilidade institucional: negociar com herdeiros, redesenhar governança, pacificar egos e reconstruir a confiança interna. É uma reestruturação invisível, mas essencial. Quando bem-sucedida, permite reverter processos de estagnação e capturar valor que estava simplesmente travado por impasses de comando.

Há ainda um terceiro tipo de situação, mais técnica e frequentemente negligenciada: empresas que estão operacionalmente viáveis, com ativos de alta qualidade, mas travadas por estruturas jurídicas, contratuais ou regulatórias. São negócios cujo valor está ali, latente, mas inacessível. O caso da Oi S.A. é particularmente ilustrativo nesse sentido. Com infraestrutura valiosa e capilaridade nacional, a empresa viu-se envolvida em um emaranhado de passivos, fusões mal resolvidas e entraves regulatórios que travaram sua capacidade de gerar valor.

Mesmo com ativos como operação móvel, redes de fibra e torres de transmissão, a companhia precisou recorrer a múltiplas recuperações judiciais e operações complexas de venda de ativos para destravar parte do valor retido. A venda da Oi Móvel, por exemplo, levou quase dois anos para ser concluída, em razão da necessidade de aprovação de agências reguladoras e negociações com credores.

Para investidores especializados, essas travas representam janelas de oportunidade: com a estrutura jurídica e regulatória certa, é possível adquirir ativos relevantes com grande desconto, convertendo risco em margem. Mas o esforço é técnico e exige paciência.

Esses três perfis mostram que o universo do Distressed M&A é muito mais amplo — e sofisticado — que a imagem de uma empresa à beira da falência sendo vendida por centavos. Em tempos de alta volatilidade econômica, juros elevados e crescente judicialização dos negócios, esse tipo de operação tende a se tornar mais frequente no Brasil. Um erro comum é associar o tema exclusivamente a empresas quebradas. E no mundo dos negócios, ver apenas a superfície é perder a chance de enxergar onde está o valor real.

Mais que coragem, esse tipo de operação exige preparo multidisciplinar: sensibilidade para o timing, leitura jurídica refinada, capacidade de negociação, engenharia societária e, acima de tudo, disposição para lidar com o que é imperfeito. Porque é justamente nas imperfeições — nos nós mal desatados, nos ativos mal aproveitados, nos negócios mal compreendidos — que os investidores atentos encontram aquilo que o mercado comum ainda não enxergou.

Matéria: Monitor do Mercado

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